Coluna Caio Gottlieb: UMA HISTÓRIA MAL CONTADA

Não sendo presidente da República, muito menos filho dele e tampouco ocupante de cargo no governo, posso abordar despreocupadamente esse assunto sem causar um incidente diplomático que provoque represálias ao Brasil.

A verdade é que muita gente, inclusive eu, ainda não engoliu a versão oficial da Organização Mundial da Saúde que atestou que o vírus que saiu da China para deflagrar a mais mortífera e duradoura pandemia do século teria saltado por acaso de uma espécie animal para o ser humano.

Tanto a questão continua aberta que um grupo de 18 cientistas afirmou em uma carta publicada há poucos dias na revista Science que não há evidências suficientes para cravar se a Covid-19 teve como origem causas naturais ou um vazamento acidental de laboratório.

Eles pedem, assim como o governo dos Estados Unidos e de outros países, uma nova investigação para explorar mais a fundo o surgimento do vírus.

Os organizadores do documento, Jesse Bloom, que estuda a evolução dos vírus no Fred Hutchinson Cancer Research Center, em Seattle, e David Relman, microbiologista da Universidade de Stanford, disseram que se esforçaram para articular um ponto de vista de “esperar para ver”, o que eles acreditam ser compartilhado por diversos cientistas.

“A maior parte da discussão que você ouve sobre as origens do SARS-CoV-2 neste momento vem, eu acho, do número relativamente pequeno de pessoas que se sentem muito certas sobre suas opiniões”, disse Bloom.

“Qualquer pessoa que esteja fazendo declarações com um alto nível de certeza sobre isso está apenas ultrapassando o que é possível fazer com as evidências disponíveis”, acrescentou.

A carta diz que “as teorias de liberação acidental de um laboratório e de transbordamento zoonótico permanecem viáveis.”

Os defensores da ideia de que o vírus pode ter vazado de um laboratório, especialmente do Instituto de Virologia de Wuhan, na China, onde os vírus da SARS foram estudados, estão em alerta neste ano desde que uma equipe da OMS divulgou um relatório alegando que tal vazamento era extremamente improvável, embora a missão nunca tenha investigado nenhum laboratório chinês.

A equipe visitou o laboratório de Wuhan, mas não o investigou.

O relatório, produzido em uma missão com cientistas chineses, foi recebido com grandes ressalvas pelos governos dos Estados Unidos e de outros países, que criticaram Pequim por não ter cooperado totalmente e limitado o acesso dos cientistas estrangeiros às informações.

O manifesto agora divulgado na Science defende uma investigação nova, mais independente e minuciosa das origens do vírus, que envolveria uma gama mais ampla de especialistas e proteção contra conflitos de interesse.

Outra das signatárias, Sarah Corbey, epidemiologista e bióloga evolucionista da Universidade de Chicago, disse: “Acho que é mais provável que o novo coronavírus tenha surgido de um reservatório animal do que de um laboratório.”

Mas “acidentes de laboratório acontecem e podem ter consequências desastrosas”, acrescentou ela. “Estou preocupada com as implicações de curto e longo prazo de não se avaliar a possibilidade de fuga do laboratório de forma rigorosa. Seria um precedente problemático.”

Seja como for, se os chineses nada têm a esconder, porque não franquear seus laboratórios para uma checagem internacional mais extensa e irrestrita?

Até mesmo porque continua sendo um fato no mínimo intrigante, para não dizer suspeito, que a China, o país mais populoso do mundo, com mais de 1,4 bilhão de habitantes, tenha registrado até agora, ao menos oficialmente, pouco mais de 4 mil e 600 óbitos, marca inferior às vidas perdidas em mais de uma dezena das nações menos habitadas do planeta.

Das duas, uma: ou estão ocultando os números reais ou descobriram a cura da doença e não contam pra ninguém.

(Leia e compartilhe outras postagens acessando o site: caiogottlieb.jor.br)

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