O conflito entre Israel e Hamas expôs conexões complexas entre a influência, o comércio ilegal, a lavagem de dinheiro e a propaganda, apoiados pelo Irã, entrelaçados com o narcotráfico global. Agora, mais do que nunca, os governos latino-americanos devem repensar nas ameaças do terrorismo em seus territórios, segundo indica um relatório de The Global Americans, um think tank dos EUA, enfocado na democracia e nos direitos humanos.
“A região tem enfrentado uma crescente instabilidade nos últimos seis anos, o que tem alimentado a expansão de organizações criminosas ligadas ao Irã”, disse à Diálogo, em 10 de janeiro, Jorge Serrano, especialista em segurança e membro da equipe consultiva da Comissão de Inteligência do Congresso do Peru,. “Grupos como Hezbollah e Hamas foram alimentados pelo conflito em Gaza, exacerbando tensões e sentimentos de ódio na América Latina.”
Esse cenário apresenta desafios significativos para o hemisfério. O aumento da violência pode elevar os custos de combustível, especialmente se os conflitos se expandirem, afetando os mais vulneráveis, como foi visto após a invasão russa na Ucrânia, declarou o Dr. Evan Ellis, professor investigador de Estudos Latino-Americanos do Instituto de Estudos Estratégicos, da Escola de Guerra do Exército dos EUA.
“Sabe-se que as organizações terroristas islâmicas se tornam ativas em tempos de fermentação e tensão, perpetrando ataques semelhantes aos da Argentina, em 1992, e contra a embaixada de Israel e o Centro Comunitário Judaico AMIA, em 1994”, disse Serrano. “Sem esquecer do trágico 11 de setembro de 2001, cometido pela organização terrorista Al Qaeda.”
Um relatório do Centro de Estudos Estratégicos do Exército do Peru observa que as consequências do ataque ao AMIA se estenderam ao Panamá no dia seguinte, com a explosão de um avião da Atlas Airlines. Essa tragédia custou a vida de 21 pessoas a bordo, incluindo passageiros israelenses e americanos.
Por outro lado, The Global Americans informou sobre a prisão no Brasil, em 12 de novembro de 2023, de um indivíduo acusado de terrorismo, ligado a um grupo militante no Líbano, associado a Hamas, Hezbollah e Irã. Essa prisão se soma a duas outras efetuadas em 8 de novembro.
Os detidos enfrentam acusações de planejamento de ataques contra alvos judeus e israelenses no Brasil e de associação com organizações terroristas, o que evidencia uma conexão próxima e que esses vínculos não surgem isoladamente, detalha Global Americans.
“O recente ataque no Brasil, desmantelado pela Polícia Federal com a ajuda da inteligência fornecida por Mossad, o serviço secreto de Israel, representa uma ameaça latente para a região da América Latina, evidenciando um novo modus operandi dessas organizações terroristas”, explicou Serrano.
O incidente no Brasil deve ser um alerta, especialmente para os 350.000 membros da comunidade judaica na América Latina e os 6 milhões nos EUA, que poderiam ser alvos de possíveis atos terroristas. É imperativo que todos os países da região reforcem suas precauções contra essa ameaça latente, afirma Pucará Defensa, uma plataforma argentina de investigação em segurança e defesa.
Terrorismo urbano
“As ligações entre Irã, Hamas e Hezbollah são fortalecidas pelo apoio da ditadura venezuelana, que responde à influência de Cuba e de um superior da Rússia. Há uma preocupação crescente de que essas conexões se transformem de atividades criminosas em atos de terrorismo urbano na América Latina”, declarou Serrano. “Os governos devem estar alertas e preparados para esse novo risco.”
Essas conexões envolvem o uso de organizações criminosas, como o Tren de Aragua, que se originou na Venezuela para ações terroristas, marcando uma perigosa mudança de estratégia que não respeita a vida de pessoas inocentes, disse Serrano. Não seria surpreendente se Irã e Hezbollah, já presentes na região há muito tempo, estejam treinando, aconselhando e financiando ações criminosas como as do Tren de Aragua,
Desenvolvimentos
Atualmente, o Hezbollah é uma organização sofisticada e perigosa, armada, treinada e equipada com alta tecnologia, longe do Hezbollah revolucionário dos anos 80, de acordo com um relatório do Instituto de Relações Internacionais da Universidade Nacional de La Plata, na Argentina.
O relatório também destaca as relações estreitas do Hezbollah com o Irã e a Síria, que influenciam sua capacidade de atacar alvos judeus, israelenses e ocidentais em todo o mundo, graças ao apoio militar, político e financeiro de ambos os países.
Sua expansão nas Américas, com presença no Canadá, nos EUA e na área da tríplice fronteira entre Argentina, Brasil e Paraguai, mostra sua rede criminosa e terrorista. Foram registradas operações em vários países latino-americanos, como Chile, Colômbia, Costa Rica, Guatemala, México, Panamá e Venezuela, indica o relatório.
Rede de inteligência migratória
Serrano destacou que “vários governos acreditam erroneamente que, se não se unirem em uma estratégia conjunta contra o terrorismo clássico e suas novas formas, como Irã e Hezbollah, poderiam evitar ser afetados, cedendo assim à chantagem terrorista”. Ele esclareceu que “a realidade é diferente e eles poderiam ser atacados a qualquer momento, independentemente de sua postura, o que dificulta a formação de uma coalizão forte”.
Em contrapartida, há notícias animadoras no horizonte. No início de 2023, o Equador, com o apoio da Europa, começou a desenvolver uma nova abordagem para combater as ameaças de organizações terroristas, narcotráfico e crimes associados ao deslocamento forçado de populações através das fronteiras. Essa nova estratégia envolve a criação de uma rede de inteligência migratória.
O sistema planeja conectar de forma abrangente vários órgãos estatais, como o Ministério da Defesa, do Interior, de Relações Exteriores, a agência de migração e os pontos de acesso e fronteiras do país, como aeroportos, portos marítimos e postos de controle. Seu principal objetivo é antecipar a chegada de pessoas suspeitas ou grupos terroristas ao país.
“Apesar de estar em fase de construção, está planejado para ser replicado em países vizinhos, como Chile, Colômbia, Paraguai, Peru e outros da região, dado o movimento impune dessas organizações criminosas por essa área”, concluiu Serrano.