O cientista que liderou a maior expedição da história ao Polo Norte alertou nesta terça-feira (15/06) que o mundo pode já ter chegado ao ponto em que o aquecimento global se tornará irreversível.
“O desaparecimento do gelo marinho de verão no Ártico é uma das primeiras minas terrestres neste campo minado, um dos pontos de inflexão que iniciamos quando levamos o aquecimento longe demais”, disse Markus Rex. “E podemos essencialmente nos perguntar se já não pisamos nesta mina e começamos o início da explosão”, completou.
A missão MOSAiC (sigla em inglês para Observatório Flutuante Multidisciplinar para o Estudo do Clima do Ártico), liderada por Rex, envolveu cerca de 300 cientistas de 20 países.
Durante a expedição, o navio quebra-gelo de pesquisa alemão Polarstern(estrela polar) navegou por mais de um ano pelo Ártico. Ele retornou à Alemanha em outubro do ano passado, com evidências de que o oceano Ártico poderá ter verões sem gelo em poucas décadas.
Agora, oito meses depois, ao apresentar as informações coletadas, Rex observou que o gelo havia tido na primavera de 2020 o recuo mais rápido desde o começo dos registros desse tipo de dado e que “a propagação do gelo marinho no verão era apenas metade do tamanho de décadas atrás.”
“Apenas uma avaliação nos próximos anos nos permitirá determinar se ainda podemos salvar o gelo marinho do Ártico durante todo o ano através de uma proteção climática rigorosa ou se já ultrapassamos este importante ponto de inflexão no sistema climático”, explicou Rex.
Além disso, segundo os dados, o gelo em 2020 tinha apenas metade da espessura e as temperaturas eram 10ºC mais altas do que em comparação com a expedição Fram, realizada na década de 1890 pelos exploradores e cientistas Fridtjof Nansen e Hjalmar Johansen.
Devido à superfície menor do gelo marinho, o oceano foi capaz de absorver mais calor no verão, o que significa que a formação do manto de gelo no outono foi mais lenta do que o normal.
Expedição milionária
A expedição custou 140 milhões de euros e retornou à Alemanha com cerca de 150 terabytes de dados e mais de 1.000 amostras de gelo.
Durante a expedição, os cientistas montaram quatro locais de observação no gelo marinho em um raio de até 40 quilômetros ao redor do Polarstern. O navio se agarrou num bloco de gelo, só se movimentando quando se deixava levar pela corrente do gelo flutuante.
Entre os dados coletados, estão amostras de água abaixo do gelo para estudar o plâncton vegetal e as bactérias e entender melhor como o ecossistema marinho funciona em condições extremas. Mais de 100 parâmetros foram medidos quase continuamente ao longo do ano de pesquisa.
As abundantes informações alimentarão o desenvolvimento de modelos para ajudar a prever como podem ser as ondas de calor, chuvas fortes e tempestades em 20, 50 e 100 anos. Além disso, espera-se que várias centenas de publicações científicas com base nos dados sejam feitas até 2023.
Stefanie Arndt, especialista em física do gelo marinho, disse ser “doloroso saber que somos possivelmente a última geração que pode experimentar um Ártico que ainda tem uma cobertura de gelo marinho no verão”.
Ela também ressaltou que a cobertura de gelo do mar “está diminuindo gradualmente e é um importante espaço de vida para os ursos polares”.
Os líderes mundiais se comprometeram, em 2015, no Acordo de Paris, a limitar o aquecimento do planeta a no máximo 2ºC em relação ao nível pré-industrial até 2100. No entanto, o acordo diz que “vai perseguir esforços para limitar o aumento a 1,5 ºC”, e reconhece que, assim, os riscos e impactos das mudanças climáticas seriam reduzidos.