Coluna Caio Gottlieb: PERGUNTAS QUE NÃO QUEREM CALAR

Aliados e adversários de Jair Bolsonaro ainda estão tentando descobrir aonde ele queria chegar com a escalada das críticas ao Supremo Tribunal Federal, especialmente ao ministro Alexandre de Moraes, que atingiram o ápice nas manifestações de 7 de Setembro e terminaram com uma constrangedora rendição (não adianta tapar o sol com a peneira) dois dias depois, articulada com maestria pelo ex-presidente Michel Temer, agora encarnando o papel de pacificador da República.

Se não havia a intenção de dar um golpe de estado, fechando o STF e o Congresso Nacional, como desejava a grande maioria de seus seguidores, que agora expressam nas redes sociais enorme desapontamento com a mudança de posição do líder, qual era, então, o objetivo final embalando o arriscado plano (se é que havia um) de levar as tensões ao extremo? Apenas retórica para encantar as bases eleitorais? Pressionar a Corte, através dos protestos da expressiva multidão que ele reuniu nas ruas, para libertar apoiadores presos por atos antidemocráticos não comprovados e extinguir o controverso inquérito das fake news?

Por outro lado, se havia a intenção de quebrar as regras democráticas para poder governar por decreto e não se submeter mais ao STF, como se depreendia de algumas de suas declarações, porque o plano (se é que havia um) não funcionou? Onde foi que a estratégia fracassou? Faltou combinar com os russos, leia-se, Forças Armadas? Houve um erro de avaliação do cenário político e militar que desencorajou uma aventura deste porte? Foi uma trucada sem carta? A forte reação das instituições o intimidou?

Talvez nunca conheceremos a fundo as muitas nuances dessa crise e jamais encontraremos as respostas para todas suposições aqui levantadas, mas o que temos hoje de concreto, no desfecho apaziguador do conflito, é a carta em que o presidente afirma que nunca quis agredir quaisquer dos poderes; que a harmonia eles e a independência de cada um devem ser obedecidas como determina a Constituição; que suas palavras contundentes decorreram do calor do momento; que reconhece as qualidades do ministro Alexandre de Moraes como jurista e professor embora divirja de algumas de suas decisões, que reitera seu respeito pelas instituições e pelas decisões judiciais; e que a democracia resulta do trabalho conjunto do Executivo, Legislativo e Judiciário em favor do povo, todos respeitando a Constituição.

Ao desdizer tudo o que vinha dizendo, Bolsonaro capitulou, mas o fez para o bem do país, à custa de um imenso e talvez irreparável desgaste político.

Comenta-se que o recuo do presidente deve ajudar a restabelecer um acordo de paz que vinha sendo costurado há três semanas com Ciro Nogueira, Arthur Lira, Rodrigo Pacheco e Gilmar Mendes.

Constariam do tratado a rejeição da ação que pede no Supremo a derrubada dos decretos das armas, uma nova regulamentação em torno da reserva Raposa Serra do Sol e a transferência do inquérito das fake News para Augusto Aras – evitando que a investigação avance sobre Bolsonaro e seus filhos.

No plano legislativo, também está prevista a aprovação de uma PEC para restringir a atuação do Supremo a temas constitucionais, a aprovação do Auxílio Brasil e de um ICMS fixo para se obter a redução dos preços dos combustíveis, a solução para os precatórios e a aprovação do nome de André Mendonça para o STF.

Parece tudo bom demais para ser verdade. Aguardemos os próximos lances do jogo.

Seja como for, se os compromissos assumidos forem cumpridos pelas partes envolvidas no suposto entendimento, Bolsonaro terá a chance de ouro de reiniciar seu governo, usar a força de sua popularidade e o apoio do Centrão (precisa mostrar a que veio) para aprovar projetos no Congresso e dedicar suas energias para resolver os problemas reais do Brasil: a recuperação da economia e o combate à pandemia, ao desemprego e à inflação.

Como disse Chico Xavier em uma de suas sábias citações, embora ninguém possa voltar atrás e fazer um novo começo, qualquer um pode começar agora e fazer um novo fim.

 

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